Mulher se adapta a próteses após ter as duas mãos cortada por ex
Em 2017, durante uma briga motivada por ciúmes, Jair da Costa, então marido da ex-doméstica Geziane Buriola da Silva, de 32 anos, decepou as duas mãos dela com um facão. Depois de 27 dias em coma induzido, Geziane viu-se impossibilitada de trabalhar e totalmente dependente de outras pessoas para tarefas básicas como comer ou pentear o cabelo.
Isso começou a mudar no último dia 7, quando ela recebeu duas próteses conseguidas com um dinheiro levantado por uma vaquinha virtual feita por amigos. Geziane contou a Universa como está a adaptação — e relembrou a história de terror que o ex-marido a fez protagonizar. Jair, preso em flagrante, foi a júri popular e acabou condenado a 15 anos e 6 meses de prisão em regime fechado.
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“Era um sábado, 8 de abril, de 2017. Eu e meu então marido, Jair da Costa, estávamos em casa em nossa rotina normal. Ele estava tomando sua cerveja, como era de costume. Não me lembro exatamente o motivo, mas algo que falei desagradou meu companheiro. Ele veio pra cima de mim com um facão e acertou um golpe na minha mão. Ele tinha ficado a semana toda afiando aquele facão e o objeto cortava como uma navalha.
Saí correndo, com um corte profundo no dedo, e pedi ajuda para uma amiga. Ela me acolheu e aquela noite dormi fora de casa. No dia seguinte, já em seu estado normal, o Jair me procurou. Mostrando-se arrependido pela briga, me pediu perdão. Como eu o amava muito, o perdoei e voltei para nossa casa.
Surpreendi-me ao chegar lá. Jair estava amável, havia limpado a casa e me tratava muito bem. Eu não imaginava que aquele comportamento agressivo se repetiria já no dia seguinte.
As próteses foram conseguidas depois que amigos fizeram uma vaquinha online Imagem:
Na noite de terça-feira, ao chegar em casa, Jair havia novamente ingerido bebida alcóolica. Ele estava agressivo e com muito ciúme, também sem motivo aparente — ele sempre foi meio possessivo e me acusava de ter outro homem. Começou uma nova discussão. Ele de novo pegou o facão e partiu para cima de mim. Para me proteger, corri para o quarto e me tranquei, mas logo ele conseguiu abrir a porta e entrar.
Ele segurou meus cabelos e ameaçou cortar meu pescoço, mas eu consegui correr para a rua. Pedi ajuda em uma casa vizinha, só que a proprietária fechou a porta na minha cara. Logo fui alcançada por Jair.
Lembro que comecei a ser golpeada com o facão.
Na tentativa de me proteger, coloquei as mãos na frente do rosto. Foi nesse momento que fui atingida.
Senti logo uma intensa dor e vi aquela cena desesperadora: minhas duas mãos estavam machucadas, os cortes eram tão profundos que apenas uma pele as mantinham grudadas ao braço.
Gritos de desespero
Caí no chão e fui golpeada mais algumas vezes no rosto, na cabeça e no abdômen. Já era por volta das 19h e chovia naquela noite. Vizinhos ouviram meus gritos de desespero e logo chamaram a polícia e o resgate.
Eu só conseguia pensar nos meus dois filhos, que estavam na casa da minha mãe naquela noite. Pedia a Deus para que me deixasse vê-los crescer e que eu pudesse sobreviver para criá-los.
Quando os bombeiros chegaram, ainda estava consciente. Muito machucada, fui levada ao hospital, onde fiquei em coma por 27 dias.
Lembro que no dia em que eu acordei, sem saber onde estava, senti muito medo de que o Jair estivesse por perto. Só depois de uma longa conversa com meu pai fiquei sabendo que ele havia sido preso no dia das agressões. Mas mesmo assim eu temia pela minha vida.
Ajuda para tudo
Foram mais dois meses de internação. Não era fácil, sem ter minhas mãos eu precisava de ajuda para tudo: comer, pentear o cabelo, ir ao banheiro. Tornei-me uma pessoa totalmente dependente.
Saí do hospital e não consegui retomar minha vida. Sem poder trabalhar, sem ter como me sustentar e sem conseguir fazer as atividades do dia a dia, fui com meus filhos morar na casa dos meus pais.
Apesar de estar bem, não me sentia segura em morar na mesma cidade em que tudo aconteceu. Cheguei a receber recados enviados pelo meu ex-marido dizendo que, quando ele saísse da cadeia, “terminar o serviço” — ou seja, me matar.
Optei por deixar a cidade e ir morar em outro município do interior de Mato Grosso. Prefiro não revelar o local para preservar minha segurança. Meus dois filhos, de 7 e 13 anos, ficaram aos cuidados dos meus pais, já que sem as mãos é muito complicado cuidar deles. Mas eu os visito com frequência.
Não foi fácil me adaptar a viver sem as mãos. Muitas atividades como pentear meu cabelo, escovar os dentes e varrer a casa eu reaprendi a fazer, mas para tantas outras continuava precisando de ajuda. Não consiguia, por exemplo, amarrar o meu cabelo. Quando quero prendê-lo, ainda hoje eu peço a ajuda de uma vizinha. Quando ela não está, saio pedindo para as pessoas na rua. Não é fácil.
O recomeço
Mas agora estou começando uma nova vida. Alguns amigos fizeram uma vaquinha online para arrecadar dinheiro para eu comprar duas próteses.
A campanha conseguiu R$ 114 mil e minhas ‘mãozinhas’ foram compradas. Elas são ótimas, mexem o dedo e tudo.
Na sexta-feira (7), minhas próteses foram entregue e agora eu já tenho mãos novamente. Ainda estou me adaptando a elas, mas já consigo pentear meu cabelo, lavar louça, varrer a casa e passar pano no chão.
Voltar a trabalhar como doméstica acho que não dá mais, mas quero muito voltar a trabalhar e a ganhar meu próprio salário. Nesse tempo todo tenho sobrevivido apenas com uma pensão de invalidez, que é de um salário mínimo, e esse dinheiro mal dá para pagar as contas.
Agora que vou retomar os movimentos, quero começar a fazer bolos ou doces para vender. Quero trabalhar em casa mesmo, já que algumas tarefas ainda são bem difíceis de eu realizar sozinha. Mas o importante é recomeçar, e isso estou fazendo dia após dia.”